quarta-feira, 20 de janeiro de 2010

Amar o Drummond



Carlos Drummond de Andrade, o mineiro de ferro, de Itabira!

***

AMAR

Que pode uma criatura senão,
entre criaturas, amar?
Amar e esquecer,
amar e malamar,
amar, desamar, amar?
Sempre, e até de olhos vidrados, amar?

Que pode, pergunto, o ser amoroso,
sozinho, em rotação universal, senão
rodar também, e amar?
Amar o que o mar traz à praia,
e o que ele sepulta, e o que, na brisa marinha,
é sal, ou precisão de amor, ou simples ânsia?

Amar solenemente as palmas do deserto,
o que é entrega ou adoração expectante,
e amar o inóspito, o áspero,
um vaso sem flor, um chão de ferro,
e o peito inerte, e a rua vista em sonho, e uma ave de rapina.

Este o nosso destino: amor sem conta,
distribuído pelas coisas pérfidas ou nulas,
doação ilimitada a uma completa ingratidão,
e na concha vazia do amor a procura medrosa,
paciente, de mais e mais amor.

Amar a nossa falta mesma de amor, e, na secura nossa,
amar a água implícita, e o beijo tácito, e a sede infinita.

***

QUERO

Quero que todos os dias do ano,
todos os dias da vida,
de meia em meia hora,
de 5 em 5 minutos,
me digas: eu te amo.

Ouvindo-te dizer: eu te amo,
creio, no momento, que sou amado.
No momento anterior
e no seguinte,
como sabê-lo?

Quero que me repitas até a exaustão
que me amas que me amas que me amas.
Do contrário evapora-se a amação,
pois ao não dizer: eu te amo,
desmentes,
apagas teu amor por mim.

Exijo de ti o perene comunicado.
Não exijo senão isto,
isto sempre, isto cada vez mais.

Quero ser amado por e em tua palavra
nem sei de outra maneira a não ser esta
de reconhecer o dom amoroso,
a perfeita maneira de saber-se amado:
amor na raiz da palavra
e na sua emissão,
amor saltando da língua nacional,
amor feito som, vibração espacial.

No momento em que não me dizes:
eu te amo, inexoravelmente sei
que deixaste de amar-me,
que nunca me amastes antes.

Se não me disseres urgente repetido,
eu te amoamoamoamoamo,
verdade fulminante que acabas de desentranhar,
eu me precipito no caos,
essa coleção de objetos de não-amor.

***

Para ele, poeta, nem tenho palavras, todas as minhas são em vão.

O silêncio basta.

Bisous!

2 comentários:

  1. Nao adianta so falar!

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  2. Oi, Anônimo (a)!

    Concordo plenamente com vc! Falar só é mto pouco, tem é que se viver, de verdade, um grande amor! Mas não cobre essa racionalidade do poeta pq ele, assim com o Vinícius de Morais, por exemplo, é só emoção, coração... É intenso... Por isso, a necessidade de se falar tanto "eu te amoamoamoamoamoamo". Mas eu sou mais ou menos que nem ele, e vc? Obrigada pela participação no blog!

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